Amor e Sexo

Casais que não fazem sexo: “Não fazemos amor há oito meses”

8 Maio, 2023

Sexo amor

"Não fazemos amor há oito meses". Este é um caso real, uma relação baseada no amor. Joana e Paulo não são caso único e garantem ser muito felizes sem sexo.

Casamento sem sexo, pode viver apenas de amor. Este é um caso real e não é único. Joana e Paulo estão juntos há sete anos. Namoraram três e há quatro decidiram casar. Têm: um filho de dois anos; uma carreira de sucesso; uma casa bonita e uma vida feliz. Só há um pormenor: “Não fazemos amor há oito meses. Se me perguntarem porquê, não sei dizer”, diz Joana, de 39 anos, nome pelo qual preferiu ser tratada, devido à delicadeza da história.

“Não tenho vontade e ele também não mostra”, continua, sob o olhar atento de Paulo, de 41, também ele com nome fictício. Joana explica por que resolveu responder ao nosso contacto e expor o assunto. “Esta é das poucas vezes que falamos disto, ponderámos muito. Decidimos falar porque há mais casais como nós e não têm qualquer doença, nem têm de ter vergonha por isso. Habituámo-nos a viver assim. Não nos procuramos. A sociedade está virada para o sexo e parece que quem não o faz não é feliz, mas não é verdade, nós somos felizes assim”, completa.

Joana não se recorda quando perdeu o desejo sexual, mas explica que temeu quando se apercebeu que não se lembrava da última vez que tinha feito amor com Paulo. “Não há uma data aconteceu. Se calhar, a vida agitada do dia-a-dia, o filho, o banho, as tarefas domésticas… Quando parava só queria ir para o sofá. Fui evitando e ele também não se mostrava interessado”, vai contando Joana.

“O tempo foi passando e nem me dei conta. Parei para pensar e foi quando percebi que já não me lembrava da última vez que ele me tinha tocado como um homem toca numa mulher. Primeiro questionei se ele tinha perdido o interesse em mim, mas depois percebi que eu também não tinha interesse nele. Questionei se o casamento tinha acabado ou estávamos a passar por uma crise… Eu olhava para as minhas amigas casadas e elas continuavam com a vida sexual ativa, pelo menos é o que dizem. Mas a verdade é que eu continuo a amá-lo”, desabafa ela. Paulo interrompe e confirma que “não é falta de amor. Simplesmente não apetece. Nem me apetece com ninguém. Parece que quanto menos se faz, menos se quer fazer”, adianta.

Falta-lhes a vontade de fazer sexo

Os dois dormem juntos, cumprimentam-se como casal quando um chega a casa, abraçam-se quando acordam. E chega. A intimidade fica por aqui. Mas será que não é só amizade? “Não. É mais do que isso. Acho que não preciso de sexo para ser feliz. E ele, pelos vistos, também não”, responde Joana, enquanto Paulo confirma abanando a cabeça.

“Quando nos deitamos, quanto menos contacto físico houver melhor, porque pode parecer que estou com interesse quando não estou”, afirma ela. Paulo reafirma o amor que tem pela mulher com quem trocou alianças. “Mas eu gosto dela, gosto de estar com ela e não me imagino sem ela.” Durante a vida a dois, há momentos em que ficam nus à frente um do outro. E Joana sublinha: “Se gosto de o ver nu? Sim. Eu vejo-o a tomar banho, brinco com ele, até sou capaz de lhe mandar uma ou outra boca, mas depois ele veste-se e acaba. Sem problema”, frisa ela.

“Nós não somos infelizes. Somos um casal normal, partilhamos tudo, funcionamos bem, damo-nos bem, rimos juntos, choramos, mas não temos intimidade”, esclarece Paulo. Os dois não deixaram de gostar de sexo. E quando o faziam como casal normal, ficavam saciados. “Quando fazemos é bom. Eu não deixei de gostar de sexo. Simplesmente, não me apetece fazê-lo com tanta frequência, três a quatro vezes, como fazíamos. Falta-me desejo. Mas nem me interesso por alguém que não conheço, extracasamento”, confessa, sem vergonhas, sabendo que vive numa sociedade que não percebe o que vive.

Procuraram ajuda de especialista

Há uma altura do ano em que os dois conseguem ter mais intimidade: nas férias. “Penso que tem que ver com a disponibilidade, mas também não é uma festa”, ri-se. Paulo e Joana foram em busca de ajuda, até porque não era a primeira vez que ficavam meses sem sexo, mas desistiram.

“Procurámos logo ao início. Fizemos consulta, tentámos resolver, mas estávamos a forçar as coisas”, explica Joana, sendo interrompida por Paulo: “Se não queremos, se não nos apetece, não fazemos. Somos felizes assim.”

Joana revela que um dos conselhos que recebeu da especialista foi precisamente não ouvir os outros e ouvir-se a ela. “Ela disse-me que, se me sentia bem assim e ele também, ótimo. Acho que é o hábito. Eu sei que ele vai dormir comigo, sei que se não fizer hoje, porque estou cansada ou porque tive um dia mau, amanhã posso fazê-lo. Mas a verdade é que amanhã também não faço e passa um e outro dia e não fazemos”, conclui.

A especialista explica

Vânia Beliz, sexóloga, explica que o facto de um casal não ter uma frequência sexual não quer dizer, de todo, que algo de errado esteja a acontecer. Não é por não se ter sexo que o amor deixou de existir:

• Por que é que um casal deixa de ter sexo? A frequência sexual tem tendência para diminuir nas relações de maior duração. Ultrapassado o momento de namoro, paixão e descoberta, outras variáveis passam a fazer parte da vida do casal e, em algumas situações, a sexualidade deixa de ser vista como algo genital valorizando‑se outras coisas.

• Esta situação é mais comum do que se possa imaginar? Há casais com baixa frequência sexual, mas isso é um problema quando na relação é constrangedor ou se alguém não está satisfeito. Muitos casais desvalorizam a quantidade privilegiando a qualidade e preferem apostar na intimidade (relações sexuais) quando estão mais disponíveis. A rotina, os filhos… são tudo fatores que alteram a nossa intimidade.

• Essa relação terá passado de amor a amizade unicamente? A relação de amizade deve fortalecer-se, mas alguns casais podem simplesmente estar a privilegiar outras áreas. As relações entre as pessoas não se podem basear apenas na sua prática sexual.

 Será essa felicidade verdadeira?

• Apesar de, em alguns casos, estes casais darem o seu testemunho e afirmarem que são felizes com a situação, será essa felicidade verdadeira? Depende de cada um. Para muitas pessoas o sexo é algo secundário e se realmente não houver problemas na relação por causa disso. Cada pessoa e casal são únicos. Seria errado dizer que, por não terem relações sexuais, não são felizes. A felicidade relacional faz-se de muitos ingredientes e cada um tem a sua receita. O importante é que no fim tudo corra bem.

• Por que é que estes casais continuaram juntos? Porque podem ter encontrado outras coisas mais gratificantes. Quantos casais com grande frequência sexual se afastam? A relação é um todo e cabe lá muita coisa, para estes casais, a relação sexual, na sua intimidade, pode ser algo que não valorizam. Pode ser uma escolha, uma característica do casal, mas também pode ser um sintoma de que algo não está bem. Será avaliado caso a caso.

Texto: Ana Lúcia Sousa com Catarina Martins

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