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Ângelo Rodrigues «com cicatrizes e sem massa muscular»: «Ele não vai voltar a ser o mesmo»

24 Outubro, 2019

Ângelo Rodrigues já saiu do Hospital Garcia de Orta, em Almada, depois de dois meses internado. A infeção deixará consequências inevitáveis.

Ângelo Rodrigues «não vai voltar a ser o mesmo». A certeza é de Rita Valença, que explica ao site da Maria quais as consequências da infeção por uma bactéria que atingiu o ator, de 32 anos, «alegadamente devido a uma injeção de testosterona nos glúteos administrada em condições desconhecidas», salvaguarda. A cirurgiã plástica debruça-se ainda sobre o tratamento «agressivo» pelo qual Ângelo passou desde que foi internado no Hospital Garcia de Orta, em Almada, a 22 de agosto passado.

Para se entender como foram as últimas semanas do artista em ambiente hospitalar e como serão os seus próximos meses (ou anos), é preciso conhecer a infeção «grave» de que foi vítima. Chama-se fasceíte necrotizante e «causa a morte dos tecidos moles do corpo, como pele, gordura e músculo». «A fasceíte necrotizante é um tipo de gangrena [morte dos tecidos por falta de irrigação sanguínea]», adianta a cirurgiã da Clínica FMR, de Filipe Magalhães Ramos.

Pernas e pés em metade dos casos e braços e mãos em 30 por cento são as zonas afetadas «na maioria das vezes». Do que é conhecido publicamente do caso do ator portuense, a fasceíte instalou-se nas pernas. «Também costuma afetar a zona perineal, que é a parte genital e a parte posterior do ânus. Quando chega a esta zona, chama-se Gangrena de Fournier. Penso que a região perineal do Ângelo também terá sido afetada, até pela proximidade dos glúteos, onde foi dada a injeção. Não consigo, claro, ter a certeza», prossegue Rita Valença, acrescentando que «pénis e escroto» podem ser atingidos.

«Vão sempre existir cicatrizes»

Ângelo Rodrigues teve alta na noite desta quarta-feira, dia 23, pelas 23h00.  «Vai iniciar o processo de fisioterapia», revelou a agência que o representa à Maria. Mas como estará, afinal, o ator quando regressar a casa? A médica garante que não será «o mesmo» que aí deu entrada, na altura para a Unidade de Atendimento Permanente, sendo transferido posteriormente para a de Cuidados Intensivos e, depois, para a de Cirurgia Plástica.

Ter estado acamado durante estes dois meses e os tratamentos a que foi submetido para debelar a infeção e reconstruir as partes afetadas podem ter resultado em alterações físicas, anímicas e psicológicas, algumas delas inevitáveis, vaticina Rita Valença. Mesmo com cirurgias estéticas, feitas para «disfarçar» as zonas do corpo de onde foi retirada pele ou tecido morto, a verdade é que Ângelo terá «sempre sequelas». «Deixa cicatrizes, que podem ser mais ou menos visíveis, mas que vão sempre existir».

Rita Valença não tem dúvidas de que Ângelo Rodrigues, ou qualquer outro paciente que passe pela mesma situação, «deve ter um acompanhamento psicológico/psiquiátrico de base, a começar na altura do internamento». «Principalmente tratando-se de uma figura pública e de uma pessoa que, ao que tudo indica, tinha o culto do corpo», realça.

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Além disso, o ator apresentar-se-á «muito mais emagrecido, sem massa muscular e até deprimido. Ele não vai ser a mesma pessoa», sublinha a médica, certificando que Ângelo Rodrigues «pode também ficar com algum défice muscular». «Isto depende sempre da extensão da fasceíte. Se a limpeza foi extensa ao ponto de tirar um compartimento muscular muito grande, pode ter sequelas na parte motora, na parte da sensibilidade. E estas podem ter recuperação ou não», atesta.

Recorde-se que o ator foi submetido a várias cirurgias para «remoção dos tecidos já mortos». «São limpezas feitas de forma sequencial, extensas e, normalmente, múltiplas. Em casos mais graves, são tão extensas que podem levar à amputação de segmentos anatómicos como pés e pernas», esclarece a mesma médica, recordando o momento em que a equipa que segue o intérprete da novela Golpe de Sorte, da SIC, ponderou recorrer à remoção da perna onde se localizou o foco da infeção.

Como são os tratamentos?

Ao longo deste processo, um cirurgião plástico tem um papel importante em duas alturas distintas: quando são feitas as limpezas /remoções de pele ou de tecidos das zonas com infeção e, numa segunda fase, na reconstrução dos defeitos que estas deixaram.

«Nesta altura, transpõem-se tecidos (os chamados retalhos, que podem levar pele, gordura e músculo e têm vascularização própria) ou ‘apenas’ pele (os enxertos, sem vascularização própria). É usada uma máquina que corta de uma determinada zona para depois colocar na que precisa de reconstrução», explica. «É um tratamento agressivo, mas não é doloroso», assegura.

Limpeza de tecidos «pode exigir remoção dos testículos»

Quando a infeção afeta a parte genital e a parte posterior do ânus, são também feitos esses desbridamentos. «Segue-se a cobertura dos testículos e do pénis com retalhos e excertos. Os pacientes podem ficar com cicatrizes e ser mais um ponto doloroso ou ter alguma estenose (formação de tecido cicatricial)», enumera a cirurgião.

Tirando as consequências visíveis, só «o acompanhamento permanente é que vai permitir saber se existem outras, em que grau existem e de que forma se podem solucionar».

«No caso da região perineal, se a gangrena de Fournier ser muito extensa, a limpeza dos tecidos inviáveis pode exigir a remoção dos testículos e, aí, surgirem complicações como impotência sexual ou disfunção erétil. É o tratamento que, por ser agressivo, poderá levar a estas complicações e não a doença», elucida.

Ângelo Rodrigues: o que o espera

Abandonar o Hospital Garcia de Orta não implica ver-se livre de tratamentos. Há um longo trabalho pela frente, a começar pelos cuidados a ter. «São pessoas que não podem expor-se ao sol numa fase inicial, que têm de usar uma série de cremes específicos», garante.

O ator terá «de ser sempre acompanhado, provavelmente ao longo de anos». «A cicatrização termina em 12 a 24 meses. Até estar completamente resolvida, tem de ter um acompanhamento permanente», afiança.

Rita Valença tem 36 anos, é formada pela Faculdade
de Medicina da Universidade do Porto, tirou
a especialidade no Centro Hospitalar de São João
(Porto) e é cirurgiã plástica da Clínica FMR
Texto: Ana Filipe Silveira; Fotos: reprodução redes sociais

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