Nacional

De moranguita a estrela de Hollywood que contracena com Jean-Claude Van Damme

10 Maio, 2019

Joana Metrass era Marina em Morangos Com Açúcar, TVI, mas depressa saltou para o grande ecrã de Hollywood. A atriz contracena ao lado de Van Dame e revela como ficou nervosa ao lado do ator.

Tem ascendência cabo-verdiana, chinesa, holandesa, argentina, francesa e italiana. Nasceu há 31 anos em Portugal e aos 16 foi viver «sozinha», durante um ano, para os Estados Unidos. A sua perceção do mundo mudou e, desde então, não se vê a «assentar arraiais» em parte alguma. «Só de pensar nisso sufoco», garante Joana Metrass em entrevista à revista Maria. 

O maior desafio passará, necessariamente, por encontrar um equilíbrio entre a carreira internacional que já começou a construir e um futuro com filhos, algo que faz parte dos seus planos de vida. 

Numa conversa que passou pelo seu desempenho em Guerra Sem Quartel, filme no qual contracena com Jean-Claude Van Damme e que pode ser visto atualmente nas salas de cinema nacionais, e pela vivência além-fronteiras, a atriz, filha de uma das fundadoras do movimento feminista em Portugal, conta ainda como tem sido viver em Los Angeles e trabalhar na Meca do Cinema na época do movimento Me Too, de apoio às vítimas de abusos sexuais. 

Está nas salas de cinema, ao lado do icónico Jean-Claude Van Damme, como uma das protagonistas de Guerra sem Quartel. Olhando agora para este filme, com a distância de mais de um ano das filmagens, o que é que vê? 

Ui… Tenho muito orgulho. O que se conseguiu fazer, os resultados, com o orçamento que havia, é inacreditável. 

 

Era um filme de orçamento reduzido. 

Era. É um filme independente, não é uma mega produção de Hollywood. Por isso, sinto-me mesmo orgulhosa. Foi construída uma cidade inteira num estúdio porque não era possível filmar nas ruas de Washington, onde a ação se passa, porque são muito perigosas. Ter ficado tão verdadeiro é incrível. 

Apesar de ser de ação, este filme não é apenas para entreter, já que passa também uma mensagem, certo? 

Sim, quisemos trazer consciência para a problemática real dos gangues nos Estados Unidos e para este em particular, o MS13 [Mara Salvatrucha, formado principalmente por salvadorenhos], e o facto de recrutarem cada vez mais miúdos de 10 a 13 anos. O deste filme começa a ser recrutado aos oito. Já deu resultados. Já houve pessoas da parte da Câmara em Washington a ligar ao realizador [Lior Geller] a agradecer, a dizer que conseguiram finalmente que fossem aprovados orçamentos para fazer ações nas escolas a alertar para este problema. 

Essa realidade dos gangues é assim tão visível nas ruas norte-americanas? 

Em Los Angeles, onde eu vivo, não se nota. Mas conheci uma senhora que trabalhava em casa de um amigo meu que me disse que o filho morreu com uma bala perdida enquanto estava no grelhador, no pátio de casa dela. Isso é relativamente ‘normal’. Há, de facto, zonas de Los Angeles onde eu não vou. 

Nunca apanhou nenhum susto? 

Uma vez perdi-me a andar de carro e estava cheia de medo. Tive de passar por ruas onde estavam pessoas – nem sem se eram de gangues -, paradas no meio da estrada, em que se vê o momento de decisão de escolha: se vão deixar passar ou não! Eu estava sozinha e mesmo de carro senti medo. Pensei «como é que eu vou sair daqui?». 

É nessas alturas que o glamour e o brilho normalmente associados a Los Angeles, por causa de Hollywood, se perde? 

Na verdade, acho que Los Angeles é uma das cidades com maior taxa de criminalidade do mundo. Eu tive imenso medo quando fui para lá, mas é tão grande que há zonas em que não se sente isso. 

Esse medo não pesou na hora de decidir se ia ou não? 

Não (risos). Pesou na da minha mãe, mas não na minha! Em todos os locais há zonas perigosas e eu acho que não se faz as coisas a pensar no pior. 

O medo nunca a impediu de avançar em busca dos seus sonhos? 

Na verdade, houve uma única vez na vida em que não fiz por ter medo. Foi quando quis ir para a América do Sul com um programa de voluntariado construir casas. Fui para a Colômbia e quando chegou a altura de ir até El Salvador havia uma guerra de gangues e a minha mãe pediu-me para eu não ir. Já as outras zonas eram complicadas e havia acordos de paz enquanto nós lá estávamos. Foi a única vez na vida em que achei que era melhor estar quieta. 

Voltando ao filme, mas olhando para si, o que vê? Orgulho também? 

Isso é sempre muito difícil. Como atriz, gosto de estar sempre a evoluir. Estou sempre a fazer aulas e a melhorar-me. Em cinema, filmamos e só vemos um ano depois, por isso há muitas coisas em que digo «agora não fazia nada disto assim». Mas tenho muito orgulho em fazer parte deste projeto. 

E contracenar com Van Damme? 

Ai, eu estava muito nervosa no primeiro dia. Ele é uma lenda! Fui a correr ver os filmes todos dele, que é uma coisa que nunca senti necessidade de fazer com mais ninguém. Mas depois cheguei lá, estávamos na mesa de ensaios, e eu olhei e ele era um colega de trabalho, que estava ali a fazer o seu melhor, e a partir desse momento ficou tudo ainda mais «quentinho». 

Perdeu o medo? 

Sim, sim. Tudo fluiu mais naturalmente e ainda bem, porque isso era essencial para as nossas personagens, que tinham de construir cumplicidade. Uma coisa que fiquei a admirar muito é que ele não se importa de sair da zona de conforto dele. Desafia-se e quer crescer como ator. Este projeto é completamente diferente de tudo o que ele fez: é ele a ser o herói desfeito. 

«A minha casa era uma mala de 23 quilos» 

A Joana saiu de Portugal em direção a Londres e daqui para Los Angeles. O nosso país era pequeno para si? 

Eu fui estudante de intercâmbio aos 16 anos. Fui sozinha, viver com uma família, para os EUA. Quando se passa por essa experiência, sendo tão nova, isso muda-nos estruturalmente. Percebemos que existe um mundo. Viajar não chega. Estar num sítio uma semana ou duas é diferente de viver na cultura, perceber aquelas pessoas e de onde vêm as nossas diferenças. Eu gosto muito disso, de perceber todas estas dinâmicas de viver em várias culturas, de me adaptar e aprender com elas. 

A própria Joana é uma mistura de culturas: tem ascendência cabo-verdiana, chinesa e holandesa da parte do pai e argentina, francesa e italiana da parte da mãe! 

Se calhar é também por isso (risos)! 

Mas qual é o seu grande objetivo? 

Viver a vida ao máximo. Gosto de olhar para trás e sentir que vive, dentro do que me foi possível, o máximo de experiências memoráveis. 

Não ambiciona assentar arraiais, como se costuma dizer? 

Isso é um dilema. Eu quero muito ter filhos. Não já, mas quero, faz parte dos meus planos de vida. E esta vida que escolhi para mim não é necessariamente justa para crianças. Nos meus primeiros dois anos fora de Portugal, eu mudei de casa 18 vezes. A minha casa era uma mala de 23 quilos. 

E agora, quantos quilos tem essa sua mala? 

Eu já criei mais estabilidade e tenho mais coisas, o que às vezes me sufoca um pouco. Mas aprendi também que isso me dá mais liberdade porque me permite ter uma base e depois viajar um mês. E agora a mala é de mão (risos), seja verão ou inverno! 

Segundo o que sei, a sua família também vive pelo mundo. 

Sim, tenho uma irmã que está cá, mas que viva na China. Tenho outra em Timor e outra em Bali. A de Timor andou sempre a mudar de um lado para o outro e tem filhos e todos são felizes assim. Portanto, não acho que para ter filhos tenha de assentar a 100 por cento num sítio. Claro, não posso mudar de casa 18 vezes em dois anos! Terei de encontrar um meio termo! Por isso é que não quero filhos para já. 

Texto: Ana Filipe Silveira

 

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