Nacional

Autista de Nazaré: «É difícil não poder olhar os outros atores nos olhos»

10 Novembro, 2019

É na pele de Bernardo, um jovem autista desprezado pelo pai, que o ator abraça um grande desafio.

Chegou, viu e está a convencer logo no seu primeiro papel em televisão. Chama-se Guilherme Moura e, apesar da curta experiência como ator, entregou-se a um desafio que poderia assustar muitos veteranos, o de dar vida a um jovem autista na novela da noite da SIC.

“Quando fiz o casting já sabia que era para um personagem com autismo. Viram que eu realmente conseguia fazer o papel e acabei por ficar. Já me tinha informado sobre esse transtorno, e visto alguma coisa, mas só depois fui aprofundando. A princípio li e vi vídeos para perceber como essas pessoas vivem e lidam com as coisas. Também vi alguns filmes como o I´m Sam, o Encontro de Irmãos, o Please Stand By e a última temporada da série Atypical, onde um jovem com autismo funcional consegue viver
muito bem em sociedade”, conta.

Leia ainda: Autismo: «Sabia que eras diferente, mas fechava os olhos e acreditava que tinhas o feitio da mãe»

“Mostrou-me que somos pessoas iguais”

Mas foi numa ida à Federação Portuguesa de Autismo, onde conheceu um jovem pouco mais velho que ele, que realmente se baseou.

“Foi o primeiro contacto que tive com alguém com autismo. Foi muito bom poder estar e falar com ele. Mostrou-me que somos pessoas iguais e fiquei comovido por ver que são pessoas puras e que sofrem quando não deviam sofrer. Não são compreendidos, muitas vezes pela família e pelos colegas que os discriminam”, adianta.

E descobrir as semelhanças entre a vida deste jovem e da sua personagem foram imprescindíveis para o papel: “Assim como o Bernardo, este rapaz com quem falei também tem problemas com o pai. Ambos são vítimas do desacreditar, de não verem o seu valor reconhecido, só porque as pessoas não sabem lidar
com as suas atitudes. Uma pessoa dita normal consegue encontrar um equilíbrio nas diversas vertentes da vida, mas um autista foca-se só imprescindíveis para o papel: “Assim como o Bernardo, este rapaz com quem falei também tem problemas com o pai.

Ambos são vítimas do desacreditar, de não verem o seu valor reconhecido, só porque as pessoas não sabem lidar com as suas atitudes. Uma pessoa dita normal consegue encontrar um equilíbrio nas diversas vertentes da vida, mas um autista foca-se só numa, e que fazem muito bem, mas há um conflito
porque não é como os pais desejavam.”

Leia ainda: Filho de Carolina Deslandes sofre de autismo! «É a criança mais especial que conheço»

“Parecia sempre que estava a ser mau colega”

Guilherme conta que chegou a sentir alguma dificuldade nas gravações quando encarnava o papel. “No início foi um bocadinho complicado para mim porque não pude evoluir mediante o tempo e as cenas. Tive de começar logo como se estivesse a acabar, porque não podia modificar, de repente, a forma como ele se comporta”, confessa.

Essa dificuldade estendeu-se à relação com os colegas do elenco. “É difícil não poder olhar os outros atores nos olhos. Ao princípio parecia sempre que estava a ser mau colega e até mal-educado, pois dava a ideia que nem estava a ouvir o que estavam a dizer. Com o tempo acabaram por perceber que tinha de ser assim.”

E será que vai ser ele a descobrir o culpado do crime: “[Risos] Esperemos que sim, mas ainda vai ter de pesquisar muito para encontrar as pistas.” Parece que este primeiro desafio foi uma aposta ganha, apesar de Guilherme confessar que não tem sido muito abordado na rua. “Não ando muito na rua, mas tenho recebido mensagens a dizerem que estou a fazer um bom trabalho.

No outro dia uma mãe de uma criança com autismo enviou-me uma mensagem a agradecer por abordar este assunto, que até há pouco tempo era tabu. Acho que é importante que o público esteja a entender a mensagem.”

Cenas com carga pesada

Foi no confronto com Albano Jerónimo e Sandra Barata Belo, os seus “pais” na ficção, que teve as cenas mais complicadas. “Fiz algumas com uma carga muito pesada, em que ele perde o controlo, mas foi muito bom contracenar com tão bons atores, que também são bons colegas e boas pessoas”, conta.

Texto: Patrícia Grilo; Fotos: Paula Alveno e Divulgação SIC

Siga a Revista Maria no Instagram

partilhar | 0 | 0