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Covid-19: Português em Milão fechado há três semanas. «Portugal devia ter aprendido com Itália»

18 Março, 2020

Nuno Serra vive em Milão desde 2006 e está fechado em casa há três semanas. O escritor revela como tem sido viver em Itália neste momento e como assiste à distância o que se passa em Portugal.

Nuno Serra é português, vive em Milão, Itália, desde 2006, é escritor e tem 40 anos. Está fechado em casa há três semanas e vê este momento de «guerra» contra o novo coronavírus com alguma expectativa. Em entrevista à Maria, Nuno explica com tem sido assistir às mortes vítimas da Covid-19. Morreram 425 pessoas nas últimas 24 horas.

Entrevista a português fechado em casa por causa da Covid-19:

Como está  viver toda esta situação em Itália?
Nuno Serra: A doença não sendo particularmente grave. É extremamente agressiva no contágio, o que leva a um enorme número de infetados. Isso provocou um caos no sistema sanitário, que não estava preparado para tanta gente em simultâneo. Faltam principalmente ventiladores. Em Milão vai ser construído um hospital de campanha com mais 400 camas na zona da Fiera Milano, visto os números continuarem a subir.
Há quanto tempo está fechado em casa e como foi recebida essa ordem de isolamento social e de quarentena?
Aqui deu-se o início do vírus na Europa e não existia a ideia clara das medidas a adoptar. Começaram com pequenas medidas. Primeiro fecharam as escolas do Norte de Itália, juntamente com bares e discotecas, logo no início de fevereiro. Quinze dias depois decretaram mais algumas medidas, como o fecho de centros comerciais. Depois, sim, passaram à quarentena, primeiro no Norte e depois em todo o país.  Quando deram a ordem de quarentena já existia na população a consciência que era a única forma de evitar a propagação do vírus, por isso foi recebida e respeitada de forma natural.
Como tem sido estar fechado em casa?
Tento aproveitar o tempo para trabalhar e estimular a criatividade da minha filha para que não pese tanto. Para me distrair, tento ler, treinar, meditar, pintar. E aproveitei para começar a estudar psicologia.
Sai de casa em alguma ocasião?
Aqui é permitido sair para ir às compras. Sair para levar o cão a fazer as necessidades (eu não tenho cão) e mais algumas exceções, como ir ao banco ou aos correios.
Que precauções toma?
Tento seguir as recomendações do sistema sanitário italiano. Lavar as mãos, evitar entrar em supermercados e preferir as pequenas mercearias. Entrar uma pessoa de cada vez nas lojas, manter a distância de pelo menos um metro das outras pessoas. Mas o melhor mesmo é ficar em casa, por enquanto.
E quando volta a entrar em casa tem algum cuidado? Quando sai usa luvas, desinfetante…
Quando entro em casa a primeira coisa é lavar as mãos com sabão, que segundo os médicos chega perfeitamente desde que se lave frequentemente. O uso de luvas e máscaras aqui é recomendado para quem está em contato com o público e para os profissionais de saúde. Por isso, eu não uso mas há muitas pessoas que usam.
Qual o ambiente que se vive nas ruas? Têm saído imagens de pessoas a cantar à janela, polícia na rua a mandar as pessoas para casa…
Não é assim em todo lado, mas sim, têm existido muitas manifestações voluntárias entre vizinhos que organizam ‘concertos’ para ajudar a passar o tempo e para evitar entrar em estados depressivos. Mas é mais no centro e sul de Itália. Aqui em Milão são mais contidos. Metem bandeiras a dizer que vai ficar tudo bem. A polícia controla quem anda na rua sem ser nos casos permitidos. Quem andar é multado entre 200 a 700 euros e nos casos mais graves arrisca três meses de prisão.
Qual foi o momento mais difícil desde que está em isolamento?
A parte mais complicada é não sabermos quando vai terminar. Primeiro diziam 27 de março, depois 3 de abril, mas já se fala em 24 de abril. Essa incerteza aliada ao facto de muitas pequenas e medias empresas que não vão conseguir manter os empregados ou continuar abertas deixam-me um pouco preocupado para o cenário que iremos encontrar quando a vida normal recomeçar.
Está em risco de perder o emprego? 
Não. Eu não. Mas muitos amigos, sim. Alguns já perderam.
Tem acompanhado as notícias em Portugal? Tem cá família, como gere essa distância e preocupação?
Tenho acompanhado visto ter aí toda a minha família. Acho que Portugal devia ter aprendido com a experiência italiana e ter sido mais célere a implementar medidas. Espero que não atinja as dimensões daqui, mas é preciso perceber que é uma coisa séria.
Qual o conselho que dá aos portugueses?
Penso que o melhor conselho é mesmo o de seguirem as instruções das autoridades e as recomendações do Serviço Nacional de Saúde. Portugal tem ótimos médicos e enfermeiros que sabem o que fazem. Seguir os conselhos deles significa ajudar a travar o vírus.
Texto: Ana Lúcia Sousa; Fotos: DR

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